sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

" Nova Educação"

Consciência Multidimensional: A Essência da Nova EducaçãoPor Giuliano Moretti*

03/12/2010 - A transformação da sociedade e seus resultados no médio e longo prazos só serão possíveis com o desenvolvimento de uma visão multidimensional dos educandos.
A perspectiva sistêmica
Na Natureza, a soma das partes não representa o Todo. Aliás, o Todo vai muito além disso. Ancoramos a nossa evolução validando a simples soma das partes para explicar e determinar a nossa jornada. Isto é, buscamos a verdade por meio de fragmentos do Universo, utilizando-nos de silogismos para uni-los, cujos resultados acreditamos ser definitivos, verdadeiros, conclusivos. E só agora, diante das evidentes crises socioambientais e econômicas, percebemos que a Existência e os seus elementos tangíveis ou não, não partem de uma verdade lógica. Mas de uma significação ilógica, irracional, paradoxal. A Verdade nasce, sim, de uma perfeição inexplicável, inacessível pela razão humana com a qual tanto nos deleitamos na embriaguez do antropocentrismo.
As filosofias orientais de vertente religiosa, como o taoísmo ou o zen-budismo, por exemplo, há séculos nos proporcionam uma centelha desta Verdade. Mas foram suprimidas pelo individualismo e pelo reducionismo superestimados pelo Ocidente. Nem o homem, nem nada é uma ilha.
Uma das grandes feridas que não cicatriza em nosso processo de evolução se dá pela inconsciência humana sobre as infinitas dimensões – e inter-relações – da totalidade que nos abraça. Arrisco a dizer que a miséria se renova através de um vácuo existencial: pela nossa privação ou incapacidade de entender plenamente a fenomenologia sistêmica que transpassa o Universo, criando-o e destruindo-o.
Adotamos como meio de desenvolvimento, então, esta pobre visão fragmentada. Assim, tentamos explicar o que somos, onde estamos, por quê, para quê e para onde vamos, seja lá o que for, no caminho trilhado pela nossa existência. Isso pode ter nos ajudado a entender as pequenas porções do Todo, facilitando a prosperidade científica e tecnológica que nos trouxe até aqui, ao lado de tudo o que é bom e de tudo o que é ruim nestas conquistas. Porém, é chegada a hora de reavaliarmos nosso posicionamento parcialista sobre o Todo, que não terá mais espaço no enfrentamento das crises que nos assolam.
Urge a construção do significado último dessa complexidade natural, pelo entendimento científico e intuitivo dos intrincados laços que nos unem. É essencial que a Consciência, palavra que anda um pouco desgastada, torne-se um instrumento para a realização de um melhor equilíbrio social, econômico e ambiental. Eu chamaria esta nova qualidade de “Consciência Multidimensional”.
Consciência Multidimensional
Essa perspectiva holística pode ser definida como uma rede de infinitos elementos interdependentes. Elementos que desenrolam os acontecimentos, o acaso das ações, das reações, das relações e suas sucessivas consequências. Seres vivos, leis naturais, leis humanas, política, informações, fluxos materiais e energéticos, números, pensamentos, substâncias, movimentos, vida, morte, motivações, sentimentos, percepções… Uma lista interminável de “coisas reais” ou “coisas virtuais”, palpáveis ou não, todas de certa forma conectadas por algo que não sabemos definir – e talvez nunca consigamos. É provável que, no futuro, a totalidade até seja descrita por uma fria equação matemática (ou inequação?), mas não acredito que algum dia ela seja compreendida em toda a sua essência.
Embora seja impossível qualificar as conexões entre tudo, a simples reflexão, através do exercício da Consciência Multidimensional, pode transformar a nossa existência daqui para frente. Nestas invisíveis e não menos reais interações é que a educação, a partir deste momento, deveria estruturar a sua base fundamental.
Para os teístas, a revelação sistêmica seria uma aproximação do plano divino sobre tudo e todos. Para os ateístas, seria um conjunto de dimensões emaranhadas, correlacionadas por leis naturais conhecidas e desconhecidas. Enfim, algo difícil de expressar até mesmo em palavras. Mas muito fácil de intuir e verificar sua onipresença.
O melhor exercício para se desenvolver a visão sistêmica, considerando nossa limitação cognitiva, é constatar que nos inserimos em meio a um entrelaço de fatos, atos, resultados, coisas e não-coisas, todos interligados e que não terminam no ser humano, mas o atravessam. Acontecimentos – bons ou ruins, conforme nossa racionalização – derivaram-se de outros e assim sucessivamente. O simples fato de pensar e exteriorizar estas ideias que você lê agora, já alterou o seu destino e de tudo aquilo que o envolve, como a propagação de uma onda. Isto é, basta uma gota de chuva no oceano para que sua qualidade se transforme. Ou um pequeno farfalhar das folhas de uma árvore envolvida pelo vento. Na esfera humana, a Consciência Multidimensional sobre atos e suas consequências nos faculta o poder de criar  um ciclo vicioso ou, se a escolha for mais inteligente, um ciclo virtuoso que potencialize e perpetue a nossa felicidade.
Atitudes que prosperam a partir da Consciência Multidimensional poderão iluminar a nossa busca por um respeito maior pela Vida, pela Felicidade Definitiva – algo relativamente experimentado por muito poucos até hoje -, o que diminuiria o sofrimento articulado por nós mesmos. Como instrumentos infinitesimais na orquestra do Universo, finalmente entraríamos em consonância com sua música.
Estimular a percepção sobre as conexões da totalidade seria uma forma de semear soluções muito menos ingênuas do que as articuladas até aqui, estabelecendo-se um ponto de partida para a relação sustentável e benéfica entre as pessoas e o Todo.
A Educação Transversal
A educação transversal deveria se basear numa provocação contínua que apontasse para o questionamento sobre esta complexa inter-relação de variáveis conhecidas e daquelas ainda adormecidas na imensidão do cosmo. Sempre, porém, com o cuidado de eliminar as insanas tentativas de explicação do desconhecido por meio de assertivas puramente místicas que nos conduzem pela contramão da sabedoria pragmática. No campo das relações humanas com o infinito que as circunda, seria buscar o estabelecimento de uma visão em que tudo, qualquer movimento, pensamento, ação, resposta, influência, traria consequências boas, ruins ou ambas para este conjunto infinito de elementos.
Educar para uma compreensão sistêmica é ensinar a beleza contida na influência que cada pessoa tem nesta rede multidimensional. É, pelo menos, uma tentativa de amplificar resultados mais favoráveis, transformando a qualidade de nossa experiência enquanto seres influentes desta rede. Uma potencialização do cosmo em sobreposição ao caos. Pacificar este último revelaria o nosso grande poder de transformação para o bem.
Professores e pedagogos, cientistas e acadêmicos, devem primar pela educação estruturada sobre estes princípios orgânicos. Têm a missão de efetivamente ampliar as nossas potencialidades para enxergarmos horizontes muito mais amplos, permitindo que todos passem, no futuro, a entender a importância de cada passo, de cada átomo, de cada processo natural, de cada pensamento aventado. No cômputo global dessas forças interativas que se somam, subtraem-se e se multiplicam, abarcariam-se resultantes rumo à ordem que tanto buscamos há milhares de anos. Acredito que este seja o maior desafio que a humanidade se depara nesta nova era: educar para a plenitude.
O Humano do Futuro
Estabelecida esta nova capacidade metacognitiva pelo estímulo correto de cada ser pensante, que transcenda o nosso individualismo, o humano do futuro, mais preparado, mais equilibrado, buscará interagir neste conjunto de dimensões de maneira a angariar resultados positivos nesta complexidade. Será aquele que, apesar de saber que nunca terá o domínio completo sobre os efeitos e consequências sistêmicas de suas ações, poderá, pelo menos, mover-se de forma a minimizar o sofrimento relacionado à vida como um todo. Este ser humano terá maior percepção sobre si, sobre seus semelhantes e não-semelhantes, respeitando a sabedoria ainda oculta no arranjo universal.
A educação baseada nos princípios holísticos e transversais a qualquer formação, deverá considerar prioritariamente:
1. A cidadania e seu exercício pleno: buscando internalizar no coletivo o seu poder de mudança, maximizando os ganhos e minimizando as perdas da vida em sociedade;
2. O respeito imprescindível ao meio ambiente: disseminando a cultura de que o Todo faz parte de si mesmo e dos outros; quando devidamente respeitado, provê saúde e perpetua a paz;
3. A experiência baseada na solidariedade: zelando pela compaixão e pelo bem-estar alheio, mitigando conflitos e multiplicando a Felicidade sem esperar nada em troca.
*Giuliano Moretti é engenheiro químico, mestre em gestão ambiental, vice-coordenador do Núcleo de Estudos Científicos em Sustentabilidade (NECS) e Diretor da Preserva Ambiental Consultoria.

Fonte: Envolverde/Núcleo de Estudos Científicos em Sustentabilidade
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