terça-feira, 27 de novembro de 2012

Ismael Vieira Borba
Escritor Xinguarense

 DISCURSO DE POSSE NA ACADEMIA DE LETRAS DO SUL E SUDESTE DO PARÁ.
            Caríssimo presidente, ilustres membros da mesa, colegas imortais da Academia de Letras do Sul e Sudeste do Pará; prezados senhores convidados, pessoal da imprensa:
            Sinto-me bastante honrado com esta deferência. Tornar-me um imortal, juntamente com os senhores, que me dão posse, neste momento, na cadeira de número 6, cujo patrono é o excelente João Guimarães Rosa, o João dos Sertões e Veredas, Sagarana..., meu conterrâneo, para mim, é muito gratificante, prazeroso.
            Não espere de mim um discurso. Sou escritor. Se tivesse a eloqüência das palavras faladas, teria sido locutor, pastor, padre...  Mas me é muito satisfeito com o dom da letra escrita, pois, nada mais sou, que um contador de histórias e estórias, causos, lendas populares.
            Estou residindo em Xinguara desde 1982, época da emancipação político administrativa dessa cidade, de Redenção, Rio Maria e outras. Portanto, testemunha ocular, in loco, da grande mudança que aconteceu nesta parte do estado desde então, o desbravar e o surgir desta rica região, um caldeirão efervescente de costumes, hábitos e tradições, gente de todos os estados, tornando para nós, escrevinhadores, matéria prima fantástica, cujos personagens e protagonistas brotam naturalmente.  A linguagem falada é dinâmica, ágil, adaptável. Uma língua viva que cresce e transforma aglutinando o que há de melhor nas massas populares. Cabe a nós escritores registrarmos esses falares, costumes, tradições, mesmo quando contrariamos os eruditos, academistas, elitistas da Língua, ferozes defensores da tradicional e antiga gramática, ortografia, críticos contumazes da maneira do povão falar, conversar, portar-se.
            Nossa função como escritores, é retratar a realidade, nua e crua, sem sermos subservientes, arrogantes, presunçosos. E sem tornar de nossos escritos cruéis escribas do apocalipse, do caos, como se o mundo não fosse o mundo e a humanidade não tivesse conserto. Observar o que acontece em nosso derredor. Para a posteridade, registrar o nosso tempo, suas nuanças, contraste. Não nos tornarmos nunca arautos da desesperança, da discórdia, do medo, dando sentido à vida, porque viver é preciso, da melhor maneira possível.
            Quiseram conceituar a arte de escrever. Para Carlos Drummond de Andrade, brincar com as palavras; Vinícius de Morais musicá-las, dando às palavras um molejo de garota do Ipanema. Os biógrafos de Ernest Hemingway, afirmaram após o seu suicídio, que, desde que fora obrigado a sair de Cuba, senão o governo norte americano o iria considerar um colaborador de Fidel Castro, não mais revisava seus textos, cortava trechos, suprimia frases, numa luta incansável e diária no sentido de atingir à perfeição, nunca satisfeito com o que escrevia. Já Jorge Luís Borges, escritor argentino, prêmio Nobel de literatura, para se saber se um livro é bom,  quando o leitor, depois de lê-lo lido várias vezes, fica o tempo todo escarafunchando trechos, parágrafos, frases, achando elementos novos, procurando entender as suas entrelinhas. É como assistir várias vezes, repetidamente, E O VENTO LEVOU, Dr. Jivago, O Poderoso Chefão... Julieen Green, cujas palavras repeti na apresentação do meu primeiro livro, Saco da Embira, em Monte Carmelo, Minas Gerais, nos idos de 1982, quando o lancei: - “Os meus livros, uma vez impressos, deixo-os, fechados, guardando os segredos das suas imperfeições”.  Outro, anônimo, disse que o bom escritor nunca padece  dos pernósticos males da solidão crônica, porque nunca está só. Como toda arte, escrever é nobre, gratificante, prazeroso.
            Há de se falar das nossas dificuldades de escritores menores, largados neste mundão de Deus, desamparados, sem acesso à uma publicação, apoio do poder público, das editoras. Neste Nortão e Nordeste brasileiro, quantos bons escritores, talentosos, morreram sem conseguir publicar suas obras, por absoluta falta de oportunidades e quantos continuam sem tê-la?  
            Felizmente, hoje, as coisas estão melhores. Aprendi com os poetas e escritores populares de Belém a imprimir obras em preços bastante acessíveis, em quantidade limitada, de modo a não levar nossas companheiras à broncas tão grandes, pois para elas, principalmente, a minha,  estamos dilapidando os nossos modestos orçamentos domésticos. As leis de incentivo cultural não chegam até nós.
            Mas, deixemos de lado as lamúrias e churumelas, porque o momento é de muita alegria, pelo menos, para mim. Tornar-me imortal desta conceituada Academia de Letras do Sul e Sudeste do Pará é o meu primeiro prêmio como escritor. E que prêmio!
            Tive seis filhos, o que são os meus livros: Saco da Embira, Operação Z, Um Lugar Muito Longe, Saco da Embira II, a Volta; Luísa, O Sol Nasce Amanhã e Flor de Lis. Estou partindo para o sétimo.
            Sintetizando toda a minha obra, rapidamente, cito um pequeno trecho do meu sexto livro, Flor de Lis,  página 192:
            “Alhures, uma coã piou naquele instante. Apesar de ser um pássaro, relativamente, pequeno, tem um piado muito alto, melancólico, triste. Ouve-se bem longe. Os colonos, dali, afirmam ser uma ave agourenta. Chama a morte. Mas é pura crendice, superstição. No Pará, milhares delas piam a todo o momento e nem há tantas mortes, não nessa proporção, conforme o piado das coãs.”
            Finalizando estas palavras, primeiro, agradeço a Deus. Sem Ele nada acontece, torna-se possível e é viável. E depois, a vocês, por esta posse estar acontecendo. Obrigado, colegas imortais. E darei o máximo de mim para honrar esta deferência, respeitando e obedecendo ao estatuto de nossa egrégia casa das letras.
            Muito obrigado mesmo. Tenho dito.
Ismael Vieira Borba é autor de seis livros: Saco da Embira, Operação Z – Um lugar muito distante, Saco da Embira II – A volta, Luisa, O Sol Nasce Amanhã, e Flor de Lis.

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