JORNALISMO POLÍTICO
A falta de transparência
Por
Luciano Martins Costa em 09/02/2015 na edição 836
Comentário para o programa
radiofônico do Observatório,
9/2/2015
A pesquisa Datafolha,
publicada no domingo (8/2) por todos os jornais de circulação nacional e com
grande repercussão nos outros meios de comunicação, revela como a imprensa
trabalha com uma agenda central e um discurso homogêneo. O ponto central da
consulta é a popularidade da presidente da República, Dilma Rousseff, embora
também tenham sido avaliados o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o
prefeito da capital paulista, Fernando Haddad.
Na segunda-feira (9), a
imprensa analisa as consequências possíveis da queda na reputação da presidente
e suas chances de reverter o processo de desgaste de sua imagem, claramente
afetada pelo escândalo da Petrobras, mas também influenciada pelo noticiário
negativo sobre a economia. Especialistas em comunicação dão suas opiniões, e,
nos bastidores de Brasília, os jornalistas garimpam especulações que procuram
mostrar um momento de indecisão e espanto nas hostes do governo petista.
Enquanto isso, as análises sobre a queda de popularidade do
governador paulista se resumem a considerá-lo uma vítima do problema da falta
de água na região metropolitana de São Paulo. A Folha de S. Paulo ajuda a empurrar a opinião no sentido de
desvincular o governador da crise hídrica, com uma nova pesquisa segundo a qual
60% dos moradores da capital paulista aprovam o rodízio no fornecimento de
água, enquanto outra consulta mostra que 65% dos brasileiros defendem o
racionamento preventivo de energia elétrica.
A observação do conjunto
noticioso e opinativo revela, mais uma vez, o que se tornou uma característica
da mídia tradicional no Brasil: com base numa fonte supostamente objetiva, como
uma pesquisa de opinião, formulam-se hipóteses que são claramente distorcidas
pela manipulação dos editores. Assim, a perda de popularidade da presidente da
República decorre de seus próprios erros, enquanto o governador paulista ganha
a chance de corrigir os danos de sua omissão e incúria ao adotar tardiamente as
medidas que deveria ter tomado muitos anos atrás.
Em suma, a leitura dos
jornais indica que a presidente Dilma Rousseff é culpada pela situação da
Petrobras e pelas dificuldades econômicas, e o governador de São Paulo é vítima
das mudanças climáticas.
Mas falta transparência a
Dilma, a Alckmin e à própria mídia.
Dilma no espelho
Como já se disse aqui em
outras ocasiões, quando se analisa a imprensa não se está trabalhando
necessariamente com a realidade, mas apenas com uma versão espelhada no
ambiente midiático. No entanto, o reflexo desse espelho tende a influenciar a
realidade, como se pode observar nas pesquisas de opinião que revelam o efeito
do viés negativo sobre uma personagem e a condescendência com que outra figura
é tratada pela imprensa.
No caso do governador
paulista, há claramente um esforço para dar guarida a suas desculpas, enquanto
a presidente da República é sitiada diariamente por manchetes negativas. No
noticiário sobre o problema do abastecimento de água em São Paulo, a estratégia
dos jornais foi, até aqui, evitar o debate sobre as causas da crise. Com
exceção de um ou outro especialista, a maioria dos textos publicados deixa
aberta a possibilidade de que tudo seja culpa de São Pedro. A imprensa evitou o
debate sobre sustentabilidade, proposto por ativistas da questão ambiental, e
restringiu o noticiário à diminuição das chuvas.
Na noite de quarta-feira (4/2), André Trigueiro, um dos mais
premiados jornalistas brasileiros, apresentou no programa Cidades e Soluções (ver
aqui), da GloboNews, uma reportagem na qual lembrava os alertas feitos em
2003 sobre as previsões de falta de água.
O programa alcançou apenas o público que acessa a TV a cabo
perto da meia-noite. Por que não na emissora de maior audiência do grupo, a TV
Globo? Por que não no horário nobre? Por outro lado, o noticiário que afeta
diretamente a imagem da presidente da República está diariamente no Jornal Nacional e nas primeiras páginas dos jornais.
Representantes do governo
federal citados pelos jornais se dizem chocados com a queda de popularidade da
presidente e dão palpites sobre como melhorar suas relações com a imprensa. Na
opinião de alguns consultores, a presidente da República estava certa ao
conclamar seus ministros a entrar na “batalha da comunicação”, e o poder
Executivo precisa aprender a lidar com os jornalistas.
Bobagem: os erros do governo
têm que ser discutidos abertamente com a sociedade, com ampla transparência; a
imprensa é um partido de oposição. http://observatoriodaimprensa.com.br/
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