Pós-verdade, opinião pública e democracia
Antonio Carlos Olivieri, da Página 3 Pedagogia & Comunicação
·
O presidente eleito dos EUA Donald Trump e
o Brexit - a saída do Reino Unido da União Europeia - são exemplos de como a
pós-verdade age sobre a opinião pública
·
Você já ouviu falar em
"pós-verdade"? Pode ser que não, mas se você está conectado com a
realidade atual, mesmo sem perceber, certamente teve contato com fatos
"pós-verdade" ou considerou "verdadeiros" alguns fatos que
não passam de versões e interpretações dos acontecimentos, embora possam ser
considerados "reais". Na coletânea de textos que informa esta
proposta de redação, há elementos para compreender melhor a palavra e o seu
significado. Levando isso em consideração, redija um texto
dissertativo-argumentativo sobre uma época em que se multiplica o papel da
pós-verdade, tornando a opinião pública mais vulnerável do que nunca à
manipulação. Que consequências isso teria para as sociedades humanas? O que a
pós-verdade pode fazer com a democracia? De que modo a maioria das pessoas
poderia se defender para, como se diz popularmente, não comprar gato por
lebre?
Pós-verdade
O Dicionário de
Oxford acaba de nos dar uma valiosa contribuição para entender o mundo em que
vivemos. Escolheu como palavra do ano uma expressão pouco conhecida:
pós-verdade. É um adjetivo. Não chega a ser novo. Tem uma década, pelo menos.
Mas os estudiosos de Oxford perceberam que nos últimos tempos seu uso passou a
ser mais frequente: em artigos acadêmicos, por escritores, nos jornais e,
finalmente, nas ruas. Pela definição do dicionário, pós-verdade quer dizer
"algo que denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência
para definir a opinião pública do que o apelo à emoção ou crenças
pessoais". Em outros termos: a verdade perdeu o valor. Não nos guiamos
mais pelos fatos. Mas pelo que escolhemos ou queremos acreditar que é a
verdade.
(...)
O terreno da
internet tem se revelado fértil para a propagação de mentiras — sempre
interessadas —, trincheira dos haters. Levamos tanto tempo para estabelecer uma visão
"científica" dos fatos, construir a isenção do jornalista, a
independência editorial e, de repente, vemos que o debate político se dá entre
"socos e pontapés". A pós-verdade arrasta a política, o jornalismo, a
justiça, a economia, a nossa vida pessoal...
Inclinação cerebral
O semanário
"The Economist" deu a capa de sua última edição para uma interessante
reportagem sobre a política "pós-verdade". Ilustra o conceito com
Donald Trump afirmando que Barack Obama é o criador do Estado Islâmico e a
campanha do Brexit dizendo que a permanência do Reino Unido na União Europeia
custa US$ 470 milhões por semana aos cofres britânicos. Não é preciso mais do que alguns neurônios e um
computador para descobrir que ambas as afirmações são falsas, mas, ainda assim,
elas prosperaram.
Obviamente, a
centenária publicação reconhece que governantes sempre mentiram, mas conjectura
que vivemos uma era em que está ficando cada vez mais fácil para políticos
inventar qualquer coisa e se dar bem. Parte do problema é a natureza humana.
Nossos cérebros têm uma perigosa inclinação por acreditar naquilo que nossos
sentimentos dizem que está certo e evitam o trabalho de conferir a veracidade
das teses de que gostamos. E, se nunca foi fácil estabelecer o que pode ser
considerado um fato na política, isso está se tornando cada vez mais difícil.
Para "The
Economist" são dois os motivos. Primeiro, instituições que se encarregavam
de facilitar a formação de consensos como escolas, ciência, Justiça e mídia vêm
sendo vistas com mais desconfiança pelo público. Além disso, passamos a nos
informar através de algoritmos que, em vez de nos expor ao contraditório, nos
enterram cada vez mais fundo naquelas versões que já estávamos mais dispostos a
acreditar. Daí aos reinos mágicos é só um pulinho.
Cognição preguiçosa
A pós-verdade
é um caso típico de aplicação da teoria da "cognição preguiçosa", criada
pelo psicólogo e prêmio Nobel Daniel Kahneman, para quem as pessoas tendem a
ignorar fatos, dados e eventos que obriguem o cérebro a um esforço adicional.
Aqui no Brasil, a
pós-verdade é nítida no caso das investigações da Lava Jato. Separar o joio do
trigo no emaranhado de versões e contraversões produzidas pelas delações
premiadas é bem complicado. Há poucas dúvidas sobre a existência de esquemas de
propinas, caixa dois eleitoral, superfaturamento, formação de cartéis e
enriquecimento de suspeitos, mas provar cada um deles com base em evidências é
uma operação complexa e demorada. Em alguns casos até inviável dada a
sofisticação dos esquemas adotados pelos suspeitos de corrupção.
Mas como existe o
interesse político envolvendo a questão e como existe a "cognição
preguiçosa", as convicções passam a ocupar o espaço das evidências e
provas. A dicotomia jurídica clássica entre o legal e o ilegal passa a ser
substituída por justificativas tipo "domínio do fato", ou seja,
convicções construídas a partir da repetição massiva de percepções individuais
ou corporativas, pelos meios de comunicação.
Observações
Seu texto deve ser escrito na
norma culta da língua portuguesa.
Deve ter uma estrutura
dissertativa-argumentativa.
Não deve estar redigido sob a
forma de poema (versos) ou narração.
A redação deve ter no mínimo 15
e no máximo 30 linhas escritas.
De preferência, dê um título à
sua redação.
Envie seu texto até 25 de
dezembro de 2016.
Confira as redações avaliadas a
partir de 1 de janeiro de 2017.
Com base nos textos acima,
elabore sua redação sobre o tema "Pós-verdade, opinião pública e
democracia." Quando ela estiver pronta, envie para bancoderedacoes@uol.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.