quinta-feira, 31 de maio de 2012

LÍNGUA & LINGUAGEM
Evolução? Mudança!
Por Sírio Possenti
      Durante algum tempo (no século 19, basicamente, mas é incrível como o tempo ideológico não passa!) acreditou-se que as línguas evoluem. Segundo o sentido mais comum da palavra, defendeu-se que haveria línguas primitivas, precárias (crença que ainda persiste em muitos domínios). Elas seriam faladas por sociedades também primitivas. Ambas evoluiriam, tornar-se-iam mais sofisticadas, adquiririam mais recursos, capazes de permitir a expressão de formas de pensamento mais complexas.
     A tese caiu por terra em decorrência de dois argumentos: a) a análise das línguas ditas primitivas por gente que sabia o que estava fazendo mostrou que não há línguas primitivas, se elas forem consideradas “em si”, isto é, objetivamente, e em cada um de seus subsistemas (fonologia, morfologia, sintaxe, semântica); b) a comparação com as línguas ditas civilizadas mostrou claramente que certos subsistemas (como o dos casos) são partilhados por línguas ditas de civilização e línguas ditas primitivas. Portanto...
     Na verdade, um terceiro argumento foi muito relevante: o latim e o grego, línguas altamente flexionais, sempre foram considerados exemplos de línguas “evoluídas”. Ora, essa avaliação deveria fazer com que o inglês fosse considerado “primitivo”, já que praticamente não tem flexões (poucas de número, nenhuma de gênero, pessoas verbais quase invariáveis etc.). Ora, considerada a “produção” em inglês – literária, filosófica, científica etc. –, a tese é completamente insustentável. Portanto...
     Os estruturalistas descobriram que cada sistema deve ser analisado imanentemente, sem comparação com outros (também em antropologia). Mas mesmo as comparações com outros sistemas destruíram a hipótese de que há línguas mais avançadas do que outras, qualquer que seja sua função (falar das coisas, produzir conceitos, narrar, fazer poesia ou chistes etc.).
      O que pode “faltar” em certas sociedades são certas instituições que agenciam as línguas de maneiras específicas: a escrita, a literatura, a ciência, o direito, a filosofia etc. Mas, mesmo assim, as análises mostram que nenhuma delas afeta o cerne estrutural das línguas. A zona mais afetada é o léxico, mas ele não faz parte da “estrutura” da língua e seu maior ou menor incremento depende de parâmetros externos a ela.

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