Risco
de o Brasil se tornar uma Grécia é real, alerta economista
Com políticas de destruição do sistema de bem-estar social e de indução do desenvolvimento, país pode chegar a desemprego e recessão profundos, avalia Esther Dweck.
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São Paulo –
A estimativa do Banco Mundial de que a crise econômica brasileira pode levar,
ou devolver, numa projeção mais pessimista, até 3,6 milhões de cidadãos a um
patamar abaixo da linha de pobreza até o fim de 2017 pode impressionar, mas não
é uma surpresa. Porém, a causa não é só a crise. Aliado a ela, cumpre papel
importante para a previsão o desmonte das políticas públicas. Juntos, os dois
fatores têm o potencial explosivo não só de consolidar, como também agravar a
previsão e aumentar a tensão social.
De modo geral, as
previsões não são nada otimistas. O mercado projeta que o Produto Interno Bruto
(PIB) cresça apenas 0,5% em 2017. A professora Esther Dweck, do Instituto de Economia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e secretária de Orçamento Federal entre 2015
e 2016 avalia que o risco de o Brasil viver uma situação similar à
vivida pela Grécia é real. "Não estou nem um pouco otimista. Se o país
crescer 0,5% este ano, o desemprego aumenta. Precisa crescer 2%, 3% para ter
uma queda de desemprego razoável. A Grécia foi proibida de fazer política
anticíclica pela Troika (União Europeia, Banco Central Europeu e Fundo
Monetário Internacional). No nosso caso, estamos abrindo mão pelas
políticas de destruição do nosso sistema de bem-estar social e da indução do
desenvolvimento".
Entre outras
consequências, os oito anos de austeridade fiscal imposta pelo sistema
financeiro à Grécia levou a uma redução de cerca de 30% do PIB do país. Com
isso, o desemprego está há cinco anos acima dos 20%, com impacto dramático
sobre os mais jovens – 44% dos gregos até 24 anos.
"No médio
prazo, medidas como a PEC que estabelece limites aos gastos públicos e a
reforma da Previdência, tendem a eliminar o 'colchão', a rede de proteção
social que, no Brasil, é bastante consolidada para um país em desenvolvimento,
apesar de pequena em comparação com países desenvolvidos", diz Esther.
"Eliminado esse 'colchão', o país fica mais vulnerável a convulsões sociais
em caso de crise econômica, como a de agora."
Emblemático é o
caso do Bolsa Família. O programa beneficia cerca de 14 milhões de famílias no
país, foi importante não apenas como parte da "rede de proteção" como
ajudou a movimentar a economia do país, mas foi estigmatizado por setores da população
como "bolsa esmola". O governo Michel Temer parece estar de acordo
com esses últimos. Embora não admita que quer diminuí-lo, está tentando acabar
com uma das lógicas do programa, que fazia uma avaliação sobre se a simples
saída da chamada "linha de pobreza" é motivo imediato da saída do
beneficiário do Bolsa Família.
Para o governo
atual, se a pessoa saiu da linha da pobreza, tem que deixar o programa. Mas
essa política é uma das que subvertem sua lógica. "Quem está muito perto
da linha da pobreza pode ter algum revés, perder a renda e precisar continuar
no benefício. Havia um mecanismo mais sensível a quem está nesse limiar. O
governo quer acabar com isso porque diz que a pessoa recebe assistência
indevida, quando na verdade é uma preocupação com as flutuações de renda que
acontecem com qualquer um", diz Esther.
Esse é apenas um
exemplo. Na verdade, o que é mais urgente é a recuperação da economia.
"Mas para isso é preciso que se tomem medidas concretas de retomada do
crescimento, e também de medidas distributivas. Este ano o salário mínimo não
teve aumento real. O Bolsa Família teve um aumento no ano passado, mas neste
ano não foi anunciado nada."
A economista
entende ainda que outras iniciativas poderiam ajudar a estender a proteção aos
cidadãos atingidos no momento de crise. Por exemplo, a ampliação das parcelas
do seguro desemprego, como foi feito em momentos de crise no passado, como em
2009. Outro exemplo: a devolução, pelo BNDES, de R$ 100 bilhões ao
Tesouro Nacional em janeiro, dinheiro que poderia estar sendo usado para o
investimento e o crescimento, inclusive no seguro-desemprego.
"Numa faixa
no limiar da linha da pobreza, a pessoa fica muito mais exposta à crise com
qualquer revés, por isso precisamos de mais mecanismos de proteção. Como todas
as ações estão sendo feitas para tirar o que tem, e não para ampliar, a
situação tende a ser bastante preocupante."
Crises
nos estados
Enquanto isso, as
crises nos estados pouco a pouco vão pipocando, como no Espírito Santo e no Rio
de Janeiro. A economista ressalta que existem particularidades nos estados, mas
aqueda de arrecadação em todo o país agrava as situações locais. "O
Espírito Santo é emblemático, porque de fato os policiais ficaram anos
sem reajuste. Isso claramente tem ligação com o ajuste fiscal forte feito no
estado (pelo governador Paulo Hartung, do PSDB)."
Já no Rio há o
movimento dos servidores, que, como lembra a economista, estão pagando a
conta decorrente da enorme queda de arrecadação com a baixa dos preços do
petróleo, já que a receita do estado é muito dependente dos royalties (o
Espírito Santo também, embora em menor grau). "Em todos os estados e
municípios está havendo queda de arrecadação muito forte. Com cada vez mais
cortes nos gastos, vamos indo cada vez mais para o buraco", conclui a professora
da UFRJ.
Ironicamente, em sua página
da internet, o Banco Mundial, que não é nenhum organismo marxista, diz o
seguinte sobre o Brasil: "Entre 2003 e 2014, o Brasil viveu uma fase de
progresso econômico e social em que mais de 29 milhões de pessoas saíram da
pobreza e a desigualdade diminuiu expressivamente (o coeficiente de Gini caiu
6,6% no mesmo período, de 58,1 para 51,5). O nível de renda dos 40% mais pobres
da população aumentou, em média, 7,1% (em termos reais) entre 2003 e 2014, em
comparação ao crescimento de renda de 4,4% observado na população geral. No
entanto, desde 2015 o ritmo de redução da pobreza e da desigualdade parece ter
estagnado".
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