quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

PEC 287: o desconforto das ruas chega à Câmara



Deputados que disputam a presidência da Casa admitem mudanças na proposta governamental. Coro do Planalto e da mídia é poderoso – mas pode ser vencido

Por Glauco Faria

Nesta segunda-feira (9) o deputado federal Rogério Rosso (PSD-DF) lançou sua candidatura à presidência da Câmara utilizando sua página do Facebook. Vestindo uma camisa da Chapecoense, o parlamentar destacou, entre outros pontos, a “independência” em relação ao Executivo, associando a questão, em seguida, à “reforma” da Previdência proposta pelo governo Temer.
Rosso disse ter feito uma pesquisa a respeito das últimas quase mil leis publicadas no Diário Oficial da União, chegando à conclusão de que nem 3% delas tinham vindo do Legislativo. “A Câmara dos Deputados deve voltar, como já foi no passado, a ter protagonismo, prioridade nos temas nacionais”, apontou, emendando com a questão previdenciária. “As questões do governo que vão para a Câmara têm de ser enfrentadas, mas sem açodamento. A reforma da Previdência, com toda sinceridade, do jeito que ela chegou na Câmara, não será aprovada. Ela não vai ter os 308 votos para que uma PEC seja aprovada. Ela vai sofrer alterações. Eu, como presidente da Câmara, a Previdência vai ser colocada, mas sem atropelos, trabalhando em um texto que comporte as demandas da área econômica, ajuste das contas públicas, mas, principalmente, que promova justiça social. Essas questões de regra de transição, idade, excepcionalidades, enfim, tenho certeza que vai ser alterado.”
A citação de Rosso não foi à toa. A PEC da “reforma” tem sido ponto central na discussão dos candidatos à presidência da Câmara dos Deputados, já que se trata de uma questão prioritária do governo em 2017 e é um tema complexo para parlamentares defenderem, tal a quantidade de “maldades” inscritas no texto original da proposta. O parlamentar do Distrito Federal representa ainda uma parcela significativa do chamado Centrão, que busca maior protagonismo no Planalto e já causou dor de cabeça ao governo na questão previdenciária.
Em dezembro, o bloco formado por 13 partidos da base governista ameaçou obstruir a votação do parecer de Alceu Moreira (PMDB-RS) na Constituição de Comissão e Justiça da Câmara. Em função do imbróglio, a instalação da comissão especial que vai analisar a PEC 287, que o governo pretendia efetivar em 2016, ficou para a volta do recesso parlamentar. A votação, feita de madrugada, foi criticada por Rosso na ocasião, sendo que ele voltou a mencionar o assunto em sua fala no Facebook. Após a sessão, o parlamentar pontuou: “O que vai valer é a proposta que nós vamos construir, com emendas e negociações”.
Jovair Arantes (PTB-GO) é outro representante do Centrão candidato ao comando da Casa, sob o lema “Câmara Independente”. A discussão sobre a autonomia em relação ao governo é sempre um tema caro aos deputados. Em geral, ela pode se traduzir também em como os parlamentares conseguem obter maior inserção junto ao Executivo, aumentando seu poder de barganha. A dita independência, aliás, foi um dos fatores que levou à presidência da Câmara o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Vale lembrar que o contexto hoje é outro em relação ao que levou Cunha ao posto mais alto da Casa. Apesar da alta impopularidade do governo Temer, as relações do Planalto com sua base são hoje menos instáveis do que no segundo mandato de Dilma. Por isso, na outra ponta da disputa, o atual presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ) tem apostado no alinhamento quase automático com o governo na “reforma” da Previdência. Na semana passada, em três ocasiões diferentes o parlamentar prometeu aprovar a PEC 287 até março, afinando seu discurso com o da propaganda oficial que prega o “caos” em caso de não aprovação da proposta.
Maia conta com o apoio velado (mas nem tanto) do Planalto, e mesmo quando sugere alterações no texto da PEC da Previdência, o jogo é ensaiado, já que as possíveis mudanças seriam aquelas previstas pelo Planalto. O parlamentar é a voz de Temer e seu sucesso na eleição da Casa vai determinar também o tamanho da força do governo na Câmara. Contudo, pesa sobre si uma possível proibição de sua candidatura, já que a Constituição veda a reeleição em uma mesma legislatura. Seus aliados argumentam que isso não se aplica em seu caso, já que ele teria assumido um “mandato-tampão”.
O imbróglio na disputa entre os três candidatos da base governista – que ainda conta com um representante oposicionista, André Figueiredo (PDT-CE) – pode causar fissuras a serem exploradas pela oposição e pelos movimentos contrários à “reforma”. A proposta já se mostrou impopular, e mobilizações podem ser decisivas para a decisão de alguns parlamentares que temem enfrentar a insatisfação de suas bases. Isso, aliado ao descontentamento que o resultado da disputa da Câmara pode gerar, é uma oportunidade para frear o ímpeto dos defensores do desmonte previdenciário.
A oposição já faz as contas e pretende obstruir a tramitação da PEC 287 na comissão especial que vai analisar o tema, e pode ser formada em fevereiro. Espera-se ao menos 50 parlamentares dissidentes, o que dificultaria o jogo para o Planalto. A pressa, hoje, é amiga do governo, mas a corrida tem muitos obstáculos para os “reformistas”.


Foto: Alan Santos/PR

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