EITOS & DESFEITAS > A ERA DA MENTIRA
Nada é o que Parece
Por Alberto Dines em 14/10/2016 na edição 923
A era da pós- verdade anunciada pela revista
britânica The Economist pode ser traduzida pela era da mentira, principalmente nesses
tempos eleitorais onde o jato lava tudo e todos. O triplex de Guarujá não
pertence a Lula e os bens armazenados ganhos durante a presidência, pagos pela
OAS, eram “bugingangas”. Os processos nos quais Lula foi incriminado são pura
perseguição.
As contas de Eduardo Cunha na Suíça nunca foram
dele. Nenhum dos apanhados por Sérgio Moro sabia de nada e só um dos bens
levados a leilão dentro da Lava Jato, uma lancha do Paulo Roberto Costa, dos
primeiros delatores da Operação, está avaliada entre R$3 milhões e R$ 785 mil.
Uma tela que pertenceu ao banqueiro Edemar Cid Ferreira , agora envolvido no
imbróglio do Lava Jato, foi vendida em Londres por 10,565 milhões de libras .
Marcelo Crivella tem 52% das intenções de voto no
Rio e deverá vencer o segundo turno dizendo que não quer acordos e omitindo seu
tio , o bispo Edir Macedo , mas por baixo do pano costura acordos com a centro
direita, e com a Igreja Universal. O adversário Marcelo Freixo, com 25% das
intenções de voto, fez uma campanha xôxa até agora parecendo que não queria
vencer, o olho está pregado no governo do Rio em 2018. Nesse jogo cruzado, o
candidato do PSOL recolhe votos de quem ganha mais de 10 salários mínimos
enquanto Crivella , forte na periferia, angaria votos na zona sul.
Fernando Haddad , prefeito petista de São Paulo
eleito pela classe média e derrotado pelos mais pobres, atua fortemente nos
seus últimos meses, não para fechar o ano bem , mas para mirar o governo em
2018 e encher o buraco do PT implodido. João Dória, rico, eleito na periferia onde o PT perdeu, não
governará por ele mas para eleger presidente seu padrinho , Geraldo Alckmin.
Alckmin é só governador de São Paulo mas está de olho em 2018 e, na costura do
plano, ameaça dar apoio na Câmara a um nome anti-Aécio, seu provável
adversário.
A Primeira Dama paulista Bia Doria desfila no seu
Porsche Cayenne mas se sente uma Evita Peron, “sou mais do povo, me sinto do
povo”. ” Quem sabe um dia todos vão poder usar Ralph Laren?” diz Doria. Doria é
mais político e marqueteiro que qualquer outro mas venceu as eleições se
autointitulando gestor.
A mulher de Temer, Marcela, elevada por força das
aparências políticas à condição de gerente do projeto Criança Feliz, fez um
discurso que não teria escrito, e resume que só quer fazer uma criança feliz ,
sem explicar qual.
Hecatombe econômica anunciada
Os brasileiros ficarão mais pobres nos próximos
anos engordando as classes C e D — mas votam nos candidatos mais ricos. Os
políticos investigados pela Lava Jato não usaram o próprio nome mas codinomes e
até hoje os promotores procuram saber quem é “Santo” e onde fica o “CEU”.
Há uma hecatombe econômica anunciada, uma guerra de
tráfico no Rio, os assaltos se avolumam em São Paulo e a aposentadoria vira uma
ilusão até na média de R$1.862,00 quando a dos políticos bate nos R$14,1 mil.
Mas os candidatos ao poder em 2018 ainda não se convenceram a baixar os salário
dos parlamentares, fixar o teto dos gastos públicos e usar os próprios carros
ou metrô para trabalhar. São caricaturas de poder , camaleões.
Quando perguntados, todos negam. E os fãs de Doria
acreditam no que ele prega: se aplicar metade das propostas de campanha , São
Paulo vira Manhattan. A 400 km de um Rio em tiroteio entre favelas,
inadimplente , onde o tráfico manda fechar quando bem entende o comércio de
Ipanema e Copacabana , e o carioca acaba acreditando que só a Igreja e a
política espiritualizada salva.
Nada é o que parece, é só ler o escritor
anglo-irlandês Jonathan Swift em 1733 ” A Arte da Mentira Política” ou o
psicólogo espanhol José María Martinez Selva, “A Grande Mentira”. Os políticos
mentem mais porque precisam seduzir as pessoas, falar de um futuro
imprevisível. Mentir é a arte de convencer o povo. Também vale se orientar pelo
livro “Verdades e Mentiras” , na lista da semana dos mais vendidos, de
Cortella, Dimenstein , Karnal e Pondé. Ou “O Declínio da Mentira” de Oscar
Wilde.
E para entender os limites do ser humano, se
aprofundar no romance do argentino-canadense Albert Manguel, “Todos os Homens
São Mentirosos” . Mas não é nos candidatos com tantos limites que queremos
votar e deixar governar. Só que eles precisam encantar e nós precisamos
acreditar em alguma coisa embora, como cantou o Nobel Bob Dylan, “só quero
dizer que posso ver através de suas máscaras”.
E ainda há quem estranhe o abandono dos jovens, a
brutal abstenção e a ascensão do antipolítico.
***
Alberto Dines é jornalista, escritor e cofundador
do Observatório da Imprensa
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